segunda-feira, outubro 08, 2018



6º encontro : Um período de estabilidade.
 

 
 
A vida volta ao normal. Os meses se passavam e o papo corria solto na Academia.
Meu amigo abriu seu secreto problema, primeiro para os professores, depois para outros colegas mais chegados.
Todos ficavam surpresos. Seu estado físico não denotava nada, pois para quem tinha sessenta e sete anos, estava muito bem. Fazia exercícios três vezes por semana e corria com o grupo nas terças e quinta feiras pela manhã. Até de competições de rua participava, com boa performance. Nos fins de semana jogava tênis com os filhos e genro. Não tolerava perder dois sets seguidos.
Neste período, o PSA estava sob controle e segundo seu oncologista, era manter assim, com o tratamento controlando a doença. Foram os melhores meses de convivência com a doença, me dizia o amigo. Apenas uma injeção mensal, de fácil tolerância. E vida normal.
Isto para consumo externo, mas no seu íntimo, uma série de questionamentos ainda assolava seus pensamentos. Um especialmente, sobre a origem e as razões de ser atingido pela doença, como se fosse um raio. O que teria contribuído para isso? Realizou sempre o acompanhamento anual prescrito pelo médico. Porque não foi diagnosticado precocemente? Ele se culpava e ao mesmo tempo procurava absolvição para si . Seria o estilo de vida , o stress dos negócios ou alguma razão de foro íntimo que nem ele próprio conhecia?
Outra questão a minar sua confiança, era a perda de autonomia. A família passou a questionar suas ações e planos futuros.Começou a ser tratado como doente, embora não se sentisse assim. Teve de se submeter e pré aprovar o que faria ou deixaria de fazer. Para quem se autodeterminou ao longo da vida, era um ultraje, um cerceamento da liberdade.
Isto gerou um processo de estresse e intolerância com as opiniões da família, e passaram a ser refutadas de pronto, criando muitos atritos.
Segundo meu amigo, estes assuntos foram mediados na consulta com o oncologista, Ele frisou a favor do paciente, escusando muitas das reações, pois julgava razoáveis nestas circunstancias.
É difícil se acostumar com a espada sob sua cabeça. A doença por vezes esquecida, voltava à tona, quando menos se espera. Numa programação de férias , nos planos futuros ou negócios. As perspectivas de vida eram sendo reavaliadas, mesmo quando outros amigos ou conhecidos, aparentemente saudáveis, se vão. Ninguém tem dia ou hora certa para morrer.
Meu amigo comentou sobre uma frase do Betinho , que diz: “uma coisa é quem vive a história , outra coisa é quem conta a historia”. Isto o deixou intrigado, pois pretendia um dia escrever sobre estas vivências, mas tinha uma preocupação de ser fiel e verdadeiro, colocando a realidade dos fatos e sentimentos, passo a passo com a realidade. Como ser autêntico sem dourar ou dramatizar os fatos ? Este será seu incitamento quando for escrever. Caminhar lado a lado, entre a história e a versão dos fatos.
Nestes momentos, era então hora de repensar e agradecer pela oportunidade da vida e seguir em frente, com aquilo que é possível e viável naquele momento. 

J T Brum 2018
 

 
 

 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

 


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