segunda-feira, outubro 29, 2018



9º Encontro : Aonde está a criança feliz que habitava aqui? 

O encontro na Academia  era todas as manhãs. Nas terças e quintas feiras meu amigo ia correr com o grupo de Corridas. Ai era só um papo rápido . Nos demais dias, tínhamos tempo para nossas conversas e considerações sobre o dia a dia.

Neste dia, ele manifestava a inquietação com o resultado dos exames e PSA. Depois de começar a tomar a nova medicação (Abiraterona) há alguns meses, os números não representavam melhora nos índices. Ao contrário, subiam a cada mês.
A família em polvorosa, buscava entender o que estava acontecendo, mas sem conhecimentos suficientes, sobre o que fazer e como proceder. O Oncologista de posse dos resultados e avaliando o período decorrido, sugeriu mudar para outro medicamento chamado de Enzoladamida.
Nestas alturas , os filhos buscando alternativas, marcaram uma consulta com outro oncologista. Um médico mais novo e mais afeito as novidades dos tratamentos , pesquisas e estudos da área de oncologia, especificamente de próstata.
Nesta consulta explicou ele: a troca de um medicamento por outro, não teria resultados, pois elas eram “primas” na sua composição. Além disso, como o tumor tinha características de agressividade (Gleason 8). Sugeria um tratamento também agressivo, para enfrentar o problema. O baixo volume de doença era uma vantagem a ser aproveitada. As metástases estavam concentradas nos ossos e com evolução controlada. O tratamento quimioterápico era o recomendado. Acreditava que o paciente suportaria bem o tratamento. Pelo seu estado físico e pelo astral apresentado.
 Saiu da consulta com mil questões. Não imaginava ter que enfrentar tão rapidamente, aquele monstro imaginário, representado pela quimioterapia e seus efeitos colaterais.
Tinha algumas questões a resolver. Voltar ao seu oncologista e dizer que não faria mais o tratamento com ele. Meu amigo tinha certo apego ao médico, pois havia uma empatia e cumplicidade com ele desde o inicio . Mas a família tinha razão: o tratamento não estava funcionando. E isto era o fundamental.
Nestes dias, ainda comentamos sobre sua experiência ao CAPC (Centro de Apoio ao Paciente com Câncer) em Florianópolis. Ele lembrava, que nestas reflexões e nas dinâmicas, surgia uma questão central, para a felicidade e paz interior dos participantes. Onde se perdeu a criança feliz que havia dentro de nós? Fazer esta busca e resgatar era nosso grande desafio. Em que momento começou a mudar, esquecê-lo ou esconder-se atrás de uma máscara ? Onde anda aquele menino ou menina que brincava alegre e sem preocupações?
 Fazer esta regressão é buscar na infância, adolescência ou na vida, onde nos perdemos. Cada um tem suas justificativas, para ter feito esta escolha, mas agora era o momento de resgatar e trazer à tona, tudo aquilo que nos fazia felizes e íntegros. Principalmente agora, para enfrentarmos as dificuldades de uma doença, ou para todos que buscam a felicidade, longe das máscaras impostas pela família, pela vida profissional ou pela sociedade, com seus estereótipos e padrões de comportamento.
A propósito me falou de um livro recomendado: “O cavaleiro preso na Armadura” de Robert Fisher, uma fábula para quem busca a Trilha da Verdade. Fiquei de comprar, para ler e buscar a minha verdade!
Ponderei a ele, que todos deveriam fazer este exercício salutar e as terapias têm esta finalidade. Até a pouco, se você falasse estar fazendo terapia, logo era taxado de desequilibrando ou com alguma debilidade mental.
Na próxima semana , meu amigo terá decisões importantes a tomar. Vai precisar ter fé, tranquilidade e acreditar que o melhor, ainda estava por vir. 

JT Brum 2018


segunda-feira, outubro 22, 2018



8° Encontro : A força das mãos. 

Nesta semana não encontrei meu amigo na academia. Devia estar viajando a passeio ou a negócios. Nada demais, afinal eram poucos dias. Só voltei a encontrá-lo na terça feira, da semana seguinte.
Estava entusiasmado e elétrico. Começou a falar e gesticular, como há muito não via. Questionei sobre seu sumiço . Abriu um largo sorriso . Começou a contar. Foi a Santa Catarina, Florianópolis , especificamente no Ribeirão da Ilha. Tinha agendado uma semana de tratamento no CAPC (Centro de Apoio ao Paciente com Câncer). Estava maravilhado . Falava com entusiasmo sobre a experiência vivida lá.
A filosofia deles é: “A alegria é a prerrogativa da alma alimentada pelo amor”. O Centro de Apoio é uma entidade filantrópica, todos os tratamentos são gratuitos. Sobrevive de doações. Os trabalhos são realizados por voluntários, médicos médiuns, enfermeiras, etc. que diuturnamente estão ali , aplicando as terapias, tais como cromoterapia, Reiki, massagem terapêutica, florais de Bach ,etc.
Ensinam que, mesmo estando doente, é possível retomar o equilíbrio emocional e espiritual. O paciente deve aprender a entender a mensagem do seu corpo , perceber que é preciso mais que tratamento médico. A recomendação é fazer o tratamento no CAPC em paralelo com as recomendações médicas, que deve ser prioritário.
Embora seja um Hospital Espírita, é ecumênico , não se presta a qualquer pratica religiosa ou espírita, na acepção da palavra. Ao contrário, diz nunca rezou tantos Pais Nosso, como na semana que esteve ali internado.
 Todo trabalho começa na segunda feira cedo, quando os inscritos passam por uma avaliação, no centro de triagem. Ali se apresentam mais de 250 pessoas doentes, oriundos das mais diversas localidades. Após criteriosa avaliação , exames dos diagnósticos individuais, são selecionados aqueles que ficarão internados e os que farão tratamento externo. Meu amigo, foi escolhido para ficar internado. Ficaria de terça a sábado, das 8hs até as 18. Iria dormir numa pousada.
Quando se apresenta pela manhã, recebe um crachá e um jaleco branco. Veste, depois de trocar de roupa , vai para um dormitório, com seis camas. Deita , aguarda pelas instruções. Uma luz tênue azul e ao som de uma música ambiente, deixa um clima propício para a reflexão. O silencio é uma imposição . Uma regra de ouro.
 Usa-se uma pequena venda nos olhos, de modo a facilitar o processo de introspecção. As terapias vão se sucedendo... Todas ministradas por enfermeiras ou médicos médiuns, com muito carinho e dedicação. Ao final de cada terapia, um grupo de médiuns, todos de branco, fica postado ao redor da sua cama , fazem uma imposição das mãos, rezando a oração da Cura : Pai Nosso que estais no Céu...
E o silêncio volta a reinar no ambiente.
 O único intervalo do dia, é para o almoço, onde todos se reúnem no restaurante . À tarde seguem os trabalhos , palestras e dinâmicas e depois retorno aos quartos.
A sensação é de você estar noutra dimensão, mais leve , sem as preocupações terrenas. Mais próximo de Deus , de si mesmo. Assim passam os dias, mergulhados nesta paz , na convivência com outros parceiros, com dificuldades e doenças mais graves que a sua. Otimistas , felizes por mais um dia de vida . Muitos desenganados pelos médicos, mas renovados na esperança, buscam dentro de si a própria cura. Quando você pensa que nada mais pode acontecer de tão bom, uma voz suave no seu ouvido pergunta, se gostaria de receber uma massagem nos pés? Uma delicia !
Ao ouvir seu depoimento, pude constatar como lhe fez bem esta semana. Não só o otimismo, mas a tranquilidade como falava da sua doença. Tinha se encontrado , estava consciente de que nem tudo que vem a nós, é um mal maior. Era uma oportunidade para crescer como pessoa.
Para arrematar me disse, algo que ouviu e ficou gravado na sua memória “Filho se estiveres doente, não te descuidas de ti, mas ora ao Senhor que te curará” (Eclesiástico 38). Foi isso que diz ter feito, nesta semana de retiro e reflexão. 

JT Brum 2018

 


segunda-feira, outubro 15, 2018





 
7º Encontro: Um sinal de alerta !

 

Encontrei meu amigo preocupado. Tive a impressão de que alguma notícia ruim tinha abalado sua estrutura, embora tão otimista e positivo.

Entre um exercício e outro , foi relatando o que estava acontecendo. Ao levar os exames ao oncologista, ficou patente : o tumor havia recrudescido. O bloqueio das células, não estava funcionando. O médico explicou que outras glândulas do organismo, além da próstata, passam a produzir testosterona e a proteção das células fica vulnerável. O PSA tinha subido de 0,26 para 3,5 . Um aumento vertiginoso em poucos meses. Tinha que refazer os exames de imagem, para avaliar a situação das metástases.

Isto implicava em nova medicação, que prometia suprir esta deficiência. Passaria a tomar comprimidos de Abiraterona. E esperar surtisse os efeitos desejados. A vida na corda bamba não fazia parte do seu dia a dia. Não estava preparado para viver entre sobressaltos e a ansiedade. Cada exame, nova consulta ou coleta de sangue, gerava uma enorme expectativa , não só para ele, mas para toda família .

Contou-me que recebeu um whatsapp de uma amiga, falando sobre um Hospital Espírita, em Florianópolis. À noite, outra foi a sua casa e cheia de dedos, perguntou-lhe se tinha espiritualidade e se acreditava que a mediunidade poderia ajudar, na cura de sua doença. Falou-lhe também do Hospital Espírita de Florianópolis.

Duas mensagens , direcionadas para ele, em menos de vinte quatro horas, não poderiam ser consideradas mera coincidência. Parou para pensar.

Dia seguinte ligou . Informou-se do funcionamento, dos períodos de internação, etc. Contou-me com certo entusiasmo, de entrar por este caminho pouco conhecido por ele e das possibilidades de tratamento. Na sua vida até então, tinha sido cético e refratário, a qualquer coisa desse tipo. Mas nestas alturas , o que tinha a perder? Não me disse se havia agendado algo.

As semanas seguintes foram de calmaria. Tomando as drogas e levando a vida como era sua rotina. Alimentava-se bem. Fazia sua pratica de exercícios regularmente.

Nas nossas conversas desta semana, ele referiu-se a outras pessoas da Academia ou até conhecidos nossos, foram diagnosticados com câncer.Fez isto naturalmente e sem surpresas. Algumas senhoras e um colega, alunos da Academia, estavam em tratamento e desafiavam com altivez suas agruras. Reconhecer isto e aceitar o fato de sentir-se bem e disposto, devia dar-lhe animo e colocava-lo em pé de igualdade, com tantas pessoas, mais novas ou mais velhas, que tem um destino indecifrável para suas vidas. Cada uma delas luta com a gana que Deus lhes deu.

Percebi então que estava trocando de fase. Saindo da negação: “isto não pode estar acontecendo comigo” e da raiva: “Porque eu? Não é justo”.

Para entrar na fase de negociação e depressão. ”Deixe-me viver até ver meus netos crescer” Finalmente, vislumbrava a fase da aceitação: “Tudo vai acabar bem”. Entender esses cinco estágios nos ajuda a termos maior consciência do que estamos passando, ao enfrentar uma mudança significativa nas nossas vidas. Traz-nos lucidez e força para lutar com nossas dificuldades.Isto tinha um efeito benéfico no seu estado de espírito e equilíbrio interno.

Contei-lhe de uma amiga, cujo câncer se concentrava na cabeça e mesmo assim, não perdia a esperança, embora todos os efeitos colaterais da doença e da medicação. Isto tudo tinha o aspecto pedagógico, para reconhecer que, seu problema era igual ou menor a tantos outros a nossa volta e que não somos o centro do mundo.

Depois disso meu amigo sentia-se mais otimista e ciente que o seu caminho, só seria percorrido por ele, sorrindo ou chorando, erguendo as mãos aos Céus, agradecendo ou praguejando contra tudo e contra todos. 

J T Brum 2018

 

 

 


segunda-feira, outubro 08, 2018



6º encontro : Um período de estabilidade.
 

 
 
A vida volta ao normal. Os meses se passavam e o papo corria solto na Academia.
Meu amigo abriu seu secreto problema, primeiro para os professores, depois para outros colegas mais chegados.
Todos ficavam surpresos. Seu estado físico não denotava nada, pois para quem tinha sessenta e sete anos, estava muito bem. Fazia exercícios três vezes por semana e corria com o grupo nas terças e quinta feiras pela manhã. Até de competições de rua participava, com boa performance. Nos fins de semana jogava tênis com os filhos e genro. Não tolerava perder dois sets seguidos.
Neste período, o PSA estava sob controle e segundo seu oncologista, era manter assim, com o tratamento controlando a doença. Foram os melhores meses de convivência com a doença, me dizia o amigo. Apenas uma injeção mensal, de fácil tolerância. E vida normal.
Isto para consumo externo, mas no seu íntimo, uma série de questionamentos ainda assolava seus pensamentos. Um especialmente, sobre a origem e as razões de ser atingido pela doença, como se fosse um raio. O que teria contribuído para isso? Realizou sempre o acompanhamento anual prescrito pelo médico. Porque não foi diagnosticado precocemente? Ele se culpava e ao mesmo tempo procurava absolvição para si . Seria o estilo de vida , o stress dos negócios ou alguma razão de foro íntimo que nem ele próprio conhecia?
Outra questão a minar sua confiança, era a perda de autonomia. A família passou a questionar suas ações e planos futuros.Começou a ser tratado como doente, embora não se sentisse assim. Teve de se submeter e pré aprovar o que faria ou deixaria de fazer. Para quem se autodeterminou ao longo da vida, era um ultraje, um cerceamento da liberdade.
Isto gerou um processo de estresse e intolerância com as opiniões da família, e passaram a ser refutadas de pronto, criando muitos atritos.
Segundo meu amigo, estes assuntos foram mediados na consulta com o oncologista, Ele frisou a favor do paciente, escusando muitas das reações, pois julgava razoáveis nestas circunstancias.
É difícil se acostumar com a espada sob sua cabeça. A doença por vezes esquecida, voltava à tona, quando menos se espera. Numa programação de férias , nos planos futuros ou negócios. As perspectivas de vida eram sendo reavaliadas, mesmo quando outros amigos ou conhecidos, aparentemente saudáveis, se vão. Ninguém tem dia ou hora certa para morrer.
Meu amigo comentou sobre uma frase do Betinho , que diz: “uma coisa é quem vive a história , outra coisa é quem conta a historia”. Isto o deixou intrigado, pois pretendia um dia escrever sobre estas vivências, mas tinha uma preocupação de ser fiel e verdadeiro, colocando a realidade dos fatos e sentimentos, passo a passo com a realidade. Como ser autêntico sem dourar ou dramatizar os fatos ? Este será seu incitamento quando for escrever. Caminhar lado a lado, entre a história e a versão dos fatos.
Nestes momentos, era então hora de repensar e agradecer pela oportunidade da vida e seguir em frente, com aquilo que é possível e viável naquele momento. 

J T Brum 2018
 

 
 

 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

 


segunda-feira, outubro 01, 2018



Resultados positivos :

 

Passados três meses, nossos encontros tornaram-se mais leves. Na academia, os exercícios mais pesados. Tudo parecia ter se encaixado, embora a expectativa mensal pelos resultados dos exames fazia meu amigo ficar sempre numa grande agonia.

O dito PSA , caia substancialmente de 78 para 3,6 no ultimo mês. O médico sempre lhe dizia que era apenas um marcador e seu estado geral, era o mais importante. Tanto assim, a cada consulta, o médico não queria nem ver de pronto os exames e sim saber como estava se sentindo e os efeitos do tratamento no seu dia a dia.

Ele orgulhoso mostrava os exames ao médico , como se fosse o boletim de colégio, para que o pai visse e assinasse. O exame físico, com avaliação de peso, pressão arterial e outras analises , os deixava mais calmo, pois tudo corria bem, com os exames laboratoriais.

Suas dúvidas e ansiedades estavam focadas nas perspectivas futuras. Até onde iria o processo de melhora? O oncologista era comedido e reticente, em apontar uma saída de cura ou a situação de evolução das metástases instaladas nos ossos.

Numa conversa na academia, abordamos o tema espiritualidade e como isto tem a ver com a tranquilidade e a paz de espírito , para lidar com os problemas físicos e emocionais. Expus a ele meu pensamento , filosofia de vida e como tratamos isto na nossa casa. Não importa a religião professada , mas sim acreditar num Ser Superior, capaz de nos incentivar a praticar o bem e ao amor o próximo.

Então , meu amigo falou da necessidade de afinidade com seu Deus. De criar uma intimidade, para ter condições de a qualquer momento pedir e agradecer, como se faz com um amigo próximo, que respeitamos e prezamos. Isto nos gera uma sensação de companhia e solidariedade. Nos deixa mais fortes , para enfrentar as dificuldades do dia a dia. Sentimos que não estamos sozinhos. Estamos falando da espiritualidade, no sentido de desenvolver a consciência, a alma, a sua conexão interna. A espiritualidade pode ser definida com uma “propensão humana a buscar significado para a vida por meio de conceitos que transcendem o tangível, à procura de um sentido de conexão com algo maior que si próprio” (Wikipédia).

Relembrando as recomendações dos médicos , para enfrentar a doença : exercícios físicos e cabeça boa. Academia, para os exercícios físicos. Trabalhar o espírito, ser otimista e se alimentar de bons pensamentos para ter cabeça boa, este o desafio.

Comentamos também sobre livros tratando das possibilidades de cura do câncer. Algo que nestes primeiros tempos, era lido com avidez, buscando a salvação nas entrelinhas. Um dos mais destacados é “Anticâncer” escrito pelo médico David Servan Schreiber. Trata-se de um relato de um médico lutando contra a doença e inventou uma nova maneira de viver.

Segundo meu amigo, depois de ler o livro, consultou seu oncologista, sobre a necessidade de consultar uma nutricionista, para avaliar seus hábitos alimentares e como poderia melhorar. Sem nenhuma ênfase, disse ele que poderia fazer bem. Mas não fez  nenhuma indicação .

A ênfase do “Anticâncer” é justamente na alimentação, a mais natural possível, com verduras , legumes e frutas. Como médico Dr. David queixa-se que, depois de diagnosticado, seus oncologistas, nunca quiseram saber o que comia ou bebia. Apenas se preocupavam com a medicação e os exames.

Ficou claro para ele , a alimentação , medicação e exames devem andar juntos. Além disso, ioga e meditação. Todos os reforços para vencer estão doença tão disseminada nos dias de hoje.

 

J T Brum 2018