segunda-feira, maio 27, 2019





28º Encontro : Resignação ou resiliência ?

Muitos questionam meu amigo , pelo fato de seus textos não ter uma ordem cronológica , nem ser um informativo do seu atual estágio de saúde. Respondeu-me, não querer que seus textos tenham um teor de boletim médico, onde se informa às últimas horas do paciente, a evolução ou involução do tratamento a que está sendo submetido. O tempo decorrido tem um “atraso” proposital de mais ou menos um ano.
Março de 2018 ele começava seu período de quimioterapias. Seu PSA esta fora de controle.  Seriam dez sessões. Como estava vacinado já com outras tantas, isto não lhe perturbava. Sabia dos efeitos colaterais e tinha aprendido a conviver com eles. Queda de cabelo, unhas, palidez e alguns enjoos nos primeiros dias. Sem falar na queda de imunidade a ser administrada, no dia a dia.
Passados estes dias mais críticos, lá estávamos nós na Academia. Entre um exercício e outro , um comentário, um papo , uma divagação sobre os assuntos do momento. Este clima de saúde, vitalidade, performance, contagiava meu amigo, embora sem as energias físicas necessárias, motivava-se a acompanhar e impregnar-se do suor alheio.
O grupo de corridas continuava sua rotina de treinos e preparavam-se para provas tanto na capital, mas muitas no interior. Meu amigo, mesmo sedento por correr, tinha ficado só na vontade. As quimioterapias tinham lhe roubado as forças, tanto das pernas como do pulmão.
Muitos se surpreendem com a vontade de viver e o apreço as coisas ligadas à saúde e a vida. Meu amigo não se porta como um doente vitima de uma doença crônica. Ele trata do assunto como se logo estivesse prestes a livra-se deste problema. Seu emocional supera o racional e sentir-se apaixonado faz parte do seu dia a dia. Isto não significa que não enfrente problemas diários, que sua vida seja um mar de rosas. Mas veja o exemplo. Passados seis dias da quimioterapia, ele contava com quinze dias de lua de mel, para curtir a vida , sem as limitações ou inconvenientes do tratamento. Assim, os períodos “problemas” ficavam abreviados e mais longos seus dias de folga e tranquilidade. Assim ele encara seis dias de quimioterapias. Com otimismo e resignação. Não há o que fazer.
A aceitação dos fatos , sem rebelar-se com a situação, tornava-o mais positivo e esperançoso, com o tratamento funcionando, voltaria a fazer tudo o que antes era normal nas suas atividades. Esta característica segundo meu amigo foi herdada de sua mãe. Ela uma mulher sem estudo, submetida à situação de trabalho doméstico e com a responsabilidade de criar sozinha um filho, sustentando com seu minguado salário. Nunca demonstrou infelicidade ou praguejou nas situações difíceis. Quando ainda pequeno pedia um brinquedo ou algo o atraía numa vitrine, com voz macia e convicta lhe dizia “Sim filho, quando não ventar, nem chover”. Isto bastava. Sabia seu pedido tinha sido aceito, mas não tinha data certa para ser realizado. Naquela época chamava-se resignação. É o mesmo que a aceitação, uma condição de estar submisso ao desejo e vontade de outra pessoa ou da ação do destino. O estado de resignação é compreendido como a ação de aceitar voluntariamente e pacificamente uma condição, mesmo que o individuo resignado não concorde com esta.
Hoje meu amigo, recordando fatos de sua infância, pôde entender muita coisa que na época não entendia. A submissão e resignação de sua mãe, sempre o deixaram intrigado, mas ela o criou livre destas pressões.
Nos nossos dias, o conceito de resiliência está em voga e definido como a capacidade de voltar ao seu estado natural, principalmente após situação crítica e fora do comum. A resiliência demonstra se uma pessoa sabe ou não funcionar sob pressão. Pode-se entender como uma evolução, um estágio acima, do que age com resignação ou daquele que amadurece e age com resiliência. Quantos de nós , estamos resignados na nossa condição de vida? Não vemos saída, nem alternativa, que nos dê paz no nosso íntimo? Apenas carregamos o fardo. Isto vale para o trabalho, para os relacionamentos, para os casamentos, para as situações da vida em geral.
Escolher a resiliência, significa buscar soluções , mesmo sob pressão e um meio termo, para as situações da vida. No caso do meu amigo e sua saúde, me parece que está neste caminho, convivendo com sua doença, ciente dos riscos, mas positivo e enfrentando a pressão dos tratamentos com maturidade. Isto não o isenta de ansiedade e às vezes impaciência, mas nunca de baixo astral, confiante e com fé em Deus e na medicina.
Foi mais uma semana de exercícios e convivência, extremamente agradável e produtiva, na companhia do meu amigo e parceiros da academia.

JTBrum 2019


segunda-feira, maio 20, 2019



27º Encontro : Sementes lançadas na terra.

Comentamos com meu amigo , no último encontro na academia, sobre as varias idéias e teorias, discutidas entre nós e lançadas por ele nos seus escritos.
São muitas teorias e constatações sobre a doença câncer. A palavra da medicina e dos médicos sobre as alternativas de tratamento. O que funciona para uns, não funciona para outros. Seu pai, médico no interior , dizia que “aquilo que o bisturi cura ,está curado”. Por isso, vemos tantos casos de cirurgias bem sucedidas, com a extração do tumor, sem deixar vestígios. Mas quando já se tem metástases, a coisa fica mais complicada.
Falamos sobre o livro do Anti Câncer do Dr. David Servan Schreiber e suas dissertações sobre o assunto. Falamos também sobre as pesquisas. Uma frase de um grande pesquisador francês René Dubos : “Sempre pensei que o único problema da medicina cientifica era o fato de ela não ser suficientemente cientifica. A medicina moderna só se tornará verdadeiramente cientifica quando os médicos e seus pacientes tiverem aprendido a tirar partido das forças do corpo e do espírito que agem através do poder de cura da natureza”.
Nosso corpo é um imenso sistema em equilíbrio, onde cada função está em interação com todas as demais. A modificação de um único desses elementos afeta necessariamente o conjunto. Cada um pode escolher por onde deseja começar: alimentação, atividade física, trabalho psicológico, ou qualquer outra abordagem que traga mais sentido e consciência a própria vida. O importante de tudo é alimentar o desejo de viver. Alguns farão participando de um coral, mergulhando em filmes cômicos, fazendo um diário ou escrevendo como fez meu amigo.
Ter consciência disso é realmente fundamental e prestar atenção aos sinais do corpo é essencial para quem deseja viver plenamente e por muito tempo.
Nestes dias, ainda comentamos sobre sua experiência ao CAPC (Centro de Apoio ao Paciente com Câncer) em Florianópolis. Ele lembrava que nestas reflexões e nas dinâmicas, surgia uma questão central, para a felicidade e paz interior dos participantes. Onde se perdeu a criança feliz que havia dentro de nós? Fazer esta busca e resgatar era nosso grande desafio. Em que momento começou a mudar, esquecê-lo ou esconder-se atrás de uma máscara ? Onde anda aquele menino ou menina que brincava alegre e sem preocupações?
A propósito me falou de um livro recomendado: “O cavaleiro preso na Armadura” de Robert Fisher, uma fábula para quem busca a Trilha da Verdade. Comprei para ler e buscar a minha verdade! Ao longo deste período, de altos e baixos, buscamos recursos e alternativas, muitas vezes , fugas e negação dos nossos reais problemas.
Para arrematar me disse, algo que ouviu e ficou gravado na sua memória: “meu filho, se estiveres doente, não te descuida de ti, mas ora ao Senhor que te curará” (Eclesiástico 38) Foi isto que diz ter feito nesta semana de retiro e reflexão.
As palavras colocadas em cada texto, refletem o estado de espírito e motivação daquele momento. Revisando estes meandros, dá para perceber, a avalanche de emoções, sensações e estado de espírito daquele momento. Numa revisão agora, queria que as palavras mais produtivas, mais sensatas, melhor aplicadas em cada texto, pudessem ser como sementes lançadas, nos corações dos leitores. Muita pretensão? Esperança? Expectativa? De tudo um pouco... Temos consciência da percepção diferente de cada leitor sobre o enfoque das palavras e seu sentido. Sobre aquilo que valorizamos e o que achamos secundário. As idéias que coincidem com nossos valores e aquelas que rechaçamos ou deixamos passar em branco.
O amor a vida, o apreço a família e aos amigos, nos tornam lutadores incansáveis pela sobrevivência. Aliados a fé, a esperança e a misericórdia Divina, seguimos nossa jornada, sem olhar para trás, apenas os olhos no futuro. 

JTBrum 2019

 


quarta-feira, maio 01, 2019

 
26º Encontro : Quimioterapias: Uma balança de prós e contras.
Depois de tentar um tratamento de ponta,sem sucesso, meu amigo voltava agora para o tratamento convencional. Ele suportava bem as quimioterapias e na primeira semana pós-quimio, era um pouco mais difícil, mas logo depois estava ele na Academia, fazendo seus exercícios e bem humorado , batendo papo com seus colegas. Lógico que tinha a perda de cabelo, da cor da pele, das unhas, Mas isto ele tirava de letra. Os efeitos colaterais para uns tem um peso, para outros nem sempre.
Sabíamos não seria a cura, com quimio, mas alongava o tempo. Agora a proposta era fazer 10 sessões, uma a cada 21 dias. Sete meses. E teria uma relativa qualidade de vida neste período. Para situar meus demais amigos, no tempo e no espaço, isto ocorreu no ano de 2018.
A expectativa é agora baixar o PSA, o desafio permanente no processo de controle e avaliação do tumor e sua atividade.
Meu amigo tem se afastado da publicação de textos, por achar que podem avaliar sua iniciativa , como um processo de vitimização, falando de sua doença, seus tratamentos. Tenho insistido com ele. Há outras facetas, para analisar na sua iniciativa.
 A primeira é, como pessoas enfrentam o mesmo problema, reagem e superam suas aflições.
Uma segunda visão é, como desmistificar este assunto: câncer , o dia a dia do paciente e como enfrentar os tratamentos recomendados. Além de outras, há um aspecto que sempre ajudou meu amigo no seu processo de encarar o assunto: como uma terapia, expondo e expondo-se nos seus textos publicados.
Meu amigo diz que muitas pessoas conhecidas, tem se manifestado , nos comentários, contando que estão passando por problema semelhante e isto tem lhes ajudado a encarar os fatos com realidade e empatia.
Quando se é diagnosticado com câncer, todos os depoimentos dizem : o mundo desaba. A morte é certa. O tempo nós o diminuímos por conta própria e não há mais o que fazer ...
Despedir-se. Abandonar os sonhos. Dizer adeus aos prazeres da vida. Mas com o passar dos dias, Deus se encarrega de nos mostrar . Ele é o Senhor do tempo e o Seu tempo não é o tempo os homens. E a vida começa a fluir ... Queiramos ou não .
No caso do meu amigo, neste mês de maio/19, completa cinco anos do diagnostico. O que comprova o escrito acima. Só Ele sabe quando é nossa hora. Nestes anos, muitos amigos, colegas e conhecidos , saudáveis, se foram sem tempo de pestanejar. Cada um tem que carregar sua cruz. Com boa vontade, relutante ou esbravejando.
Os textos dos nossos encontros na Academia ou fora dela, retratam o dia a dia, nestes anos, e tem depoimentos de pessoas acompanhando de perto ou a distancia, mas sempre com importante interesse, pelo próximo capitulo. Agora alguns até cobram pelos capítulos pendentes.
A força e as demonstrações de carinho, dos amigos , parentes , familiares, e até dos netos que perderam, no momento, o companheiro nas brincadeiras, nos dão força para seguir em frente, com fé e esperança.
JT Brum 2019